Lei Maria da Penha faz 3 anos e é usada para homens

Débora Pinho - Spacca

22 de setembro de 2006. Um vigilante tenta estrangular a sua ex-mulher, com quem viveu durante 14 anos e estava separado há quatro meses. É impedido por uma amiga da ex. Ele foge para uma casa ao lado. A ex-mulher vai à delegacia. Policiais encontram o vigilante sentado no portão da casa e o prendem. Esta poderia ser apenas mais uma história de agressão doméstica se não fosse a primeira autuação em flagrante no dia em que entrou em vigor a Lei Maria da Penha. O caso, que aconteceu no Rio de Janeiro, marcou o início de vigência de uma lei que foi baseada em outra história de agressão — a de Maria da Penha. Em 1983, o marido tentou matá-la duas vezes. Na primeira com um tiro e na segunda, tentou eletrocutá-la. Ela ficou paraplégica. Virou símbolo da luta contra violência doméstica e deu nome à lei, que nasceu há três anos pra proteger mulheres, mas tem sido aplicada pelo Judiciário também em alguns casos para homens vítimas de agressões domésticas.




O marido de Maria da Penha, professor universitário, foi condenado e passou dois anos na prisão, em regime fechado. Ganhou a liberdade de volta em 2002. O caso foi levado por Maria da Penha, ainda inconformada, pelo Centro pela Justiça e o Direito Internacional e pelo Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Além da repercussão internacional do episódio, um grupo de trabalho coordenado pela Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, do governo, encaminhou proposta de lei ao Congresso Nacional. Foram feitas várias audiências públicas durante o ano de 2005 nas Assembleias Legislativas das cinco regiões do país. A proposta foi aprovada no Congresso e se transformou na Lei 11.340, sancionada pelo presidente Lula no dia 7 de agosto de 2006. Mais rigorosa em casos de violência, ela entrou em vigor em 22 de setembro do mesmo ano.
A lei mudou o Código Penal brasileiro. Permitiu que agressores sejam presos em flagrante e tipificou vários tipos de violência contra a mulher — as de ordem física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Também aumentou de um para três anos o tempo máximo de prisão e previu medidas protetivas, como a saída do agressor do domicílio e a proibição de sua aproximação da mulher. Ficou proibido que a pena por violência doméstica seja fixada em cestas básicas como acontecia. A nova norma alterou a Lei de Execuções Penais para que o juiz possa determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.
Desde que foi criada, a lei passou a ser aplicada amplamente para mulheres que sofriam agressões. Há uma corrente que entende que a norma é inconstitucional por violar o artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal, que trata do princípio da igualdade entre homens e mulheres. Outra corrente entende que a lei pode ser aplicada também para proteger os homens, embora a norma preveja expressamente que serve para proteger somente as mulheres.
Em Cuiabá (MT), por exemplo, o juiz Mário Roberto Kono de Oliveira, do Juizado Especial Criminal Unificado, acatou os pedidos de um homem que alegou sofrer agressões físicas, psicológicas e financeiras por parte da sua ex-mulher. O juiz disse, na ocasião, que o homem não deve se envergonhar em buscar socorro junto ao Poder Judiciário para acabar com as agressões das quais é vítima. Ele impediu a ex-mulher do autor de se aproximar dele a uma distância inferior a 500 metros e de manter qualquer contato. Na ação, foram anexados documentos como registro de ocorrência, pedido de exame de corpo de delito, nota fiscal de conserto de veículo danificado por ela e diversos e-mails intimidatórios e ofensivos enviados pela mulher. O juiz aplicou a lei por não existir outra similar para casos em que o homem é a vítima da agressão doméstica.
No Rio Grande do Sul, o juiz Alan Peixoto também estendeu as medidas de proteção definidas pela Lei Maria da Penha para um homem. Peixoto determinou que a ex-companheira permanecesse a uma distância mínima de 50 metros dele. Para o juiz, a mulher “se utilizava da medida protetiva deferida em seu favor para perturbar o suposto agressor”. Antes disso, decisão semelhante foi concedida determinando que o homem não se aproximasse da ex.
Em Minas Gerais, o juiz Edilson Rumbelsperger Rodrigues considerou inconstitucional a Lei Maria da Penha. Por isso, rejeitou todos os pedidos de medidas contra homens que agrediram e ameaçaram suas companheiras nos casos que chegaram em sua comarca. Segundo ele, "não há em todo o texto constitucional uma só linha que autorize darmos tratamento diferenciado a homens e mulheres quando em voga a condição de partes processuais ou vítimas de crime".
Embora a aplicação da lei dependa da interpretação de cada juiz, com a norma, o Brasil passou a ser o 18º país da América Latina a contar com um dispositivo legal específico para os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. E, também, passou-se a ter mais estatísticas divulgadas, ainda que os números não considerem violência doméstica contra homens.
De acordo com o Ligue 180 — a central de atendimento à mulher —, o número de relatos de mulheres vítimas de violência no país cresceu 33% no primeiro semestre de 2009, em relação ao mesmo período de 2008. Outro levantamento nas Varas de Violência Doméstica e Familiar apresentado pelo Conselho Nacional de Justiça indicou que, de julho a novembro de 2008, o número de processos em tramitação por violência doméstica contra mulheres chegou a 150,5 mil. Eram 41,9 mil ações penais e 19,8 mil ações cíveis. E ainda 19,4 mil medidas protetivas concedidas e 11,1 mul agressores presos em flagrante.

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Raimundo Accioly

Cidadão comum da cidade de Tarauacá no Estado do Acre, funcionário público, militante do movimento social, Radio Jornalista, roqueiro e professor. Entre em Contato: accioly_ne@yahoo.com.br acciolygomes@bol.com.br 68-99775176

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