Trump largou o bolsonarismo ferido na estrada
Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo tinham certeza que o governo dos EUA sequer receberia os brasileiros. Tiveram que engolir uma conversa que ignorou completamente Jair Bolsonaro.
Em julho, quando Donald Trump impôs um tarifaço sobre produtos brasileiros, Eduardo Bolsonaro se apresentou como um articulador junto ao governo americano e disse que seria “mais fácil um porta-aviões americano chegar ao Lago Paranoá” do que o vice-presidente Geraldo Alckmin ser recebido por autoridades americanas.
Flávio Bolsonaro foi além e trouxe para a mesa duas bombas atômicas: “Essa situação tem que ser encarada como uma negociação de guerra sim, em que nós não estamos em condições normais, de exigir nada do Trump. Ele vai fazer o que ele quiser, independente da nossa vontade. Cabe a nós termos a responsabilidade de evitar que caiam duas bombas atômicas aqui no Brasil para depois anunciarmos que vamos fazer anistia”.
Os bolsonaristas juraram que autoridades brasileiras não seriam recebidas pelo governo norte-americano. Pior que isso: disseram que os EUA poderiam atacar militarmente o Brasil caso Jair Bolsonaro fosse preso.
Iniciou-se uma pressão, principalmente por parte da grande imprensa, para que Lula ligasse para Trump. Afinal de contas, uma republiqueta das bananas sofreria economicamente com o tarifaço da maior potência do mundo. O brasileiro não só não ligou, como continuou criticando a postura imperialista do americano.
O tempo passou e a economia brasileira não sofreu grandes impactos. Aliás, nossas exportações estão batendo recordes mesmo após o tarifaço. No fim das contas, quem mais sofreu foi o governo dos EUA, que passou a ser pressionado por empresários para revogar as tarifas contra o Brasil.
Lula não precisou ligar. Foi Trump quem ligou, não para ameaçar com porta-aviões ou com bombas atômicas, mas para dizer que os americanos estão sentindo a falta do café brasileiro. O americano não citou o nome de Bolsonaro ou condenou a “ditadura do judiciário". Nada disso. Trump chegou pisando fofo, só no sapatinho.
Três meses após as falas ameaçadoras dos filhos de Bolsonaro, o chanceler brasileiro Mauro Vieira foi recebido na Casa Branca pelo secretário de estado dos EUA Marco Rubio, designado por Trump para liderar as negociações com o Brasil.
Rubio também é um desses maluquinhos embriagados pela ideologia de extrema direita tal qual Eduardo Bolsonaro, mas antes de tudo é um soldado de Donald Trump. Dentro do surrealismo bolsonarista, a indicação de Rubio para a negociação foi um sinal inequívoco de que o governo americano iria jogar duro com o Brasil.
Os afagos de Trump seriam parte de uma estratégia de negociação para puxar o tapete do brasileiro.
Um dia antes da reunião com o chanceler brasileiro, integrantes do governo americano deram declarações acusando o judiciário brasileiro de perseguir até cidadãos americanos. O Representante Comercial dos EUA, Jameson Greer, afirmou que a maior parte da alíquota sobre o Brasil é explicada pela “imensa preocupação acerca do Estado de Direito, censura, e direitos humanos” no país.
A declaração acendeu um alerta no Itamaraty e deixou o bolsonarismo em festa. Os nepobabys do golpismo, Paulo Figueiredo e Eduardo Bolsonaro, comemoraram nas redes sociais. Esse seria um sinal claro de que o governo dos EUA iria tratar de pautas políticas nas conversas com o Brasil.
Bom, a reunião aconteceu e ambos os representantes dos governos saíram dela satisfeitos. A gritaria de Eduardo Bolsonaro e dos trumpistas mais obcecados ideologicamente não sentou à mesa com os adultos.
Mais uma vez, o nome de Bolsonaro não foi citado e os assuntos políticos internos do Brasil não foram objeto de discussão. O clima foi de cordialidade e não houve qualquer intimidação à soberania brasileira. Assim como o presidente dos EUA, Rubio teve que pisar fofo com o Brasil.
Confirma-se o que já se supunha: o bolsonarismo foi mesmo largado ferido na estrada por Trump. Mais do que um maluquinho de extrema direita, o americano é um homem de negócios. Se for do interesse dele, até química com líderes de regimes comunistas pode rolar. Amigos, amigos negócios à parte.
Não nos esqueçamos da excelente relação que Trump mantém com o ditador norte-coreano Kim Jong Un. Ali a química rolou forte. Em 2017, Pyongyang lançou uma série de testes de mísseis provocativos, aumentando a tensão com os EUA e motivando provocações de Trump a Kim no Twitter.
Depois dessa rusga inicial, os dois líderes passaram a trocar cartas respeitosas — classificadas por Trump como “cartas de amor” — e se encontraram três vezes. "Você e eu temos um estilo único e uma amizade especial". escreveu Trump em uma das cartas. Isso demonstra que, ao contrário dos delírios bolsonaristas, Donald Trump não tem grandes compromissos com ideologias.
Ambos os países classificaram o encontro como positivo e publicaram uma nota em conjunto — uma clara demonstração de que os dois países estão se entendendo. As conversas sobre tarifas ainda não aconteceram, ainda é um primeiro passo, mas já está definidio que assuntos políticos não entrarão em pauta nas próximas rodadas de negociações.
Mauro Vieira declarou ao sair da reunião: “Prevaleceu uma atitude construtiva, com aspectos práticos para a retomada das negociações entre os dois países. Há boa química entre os governos, e o diálogo está aberto.”
O bolsonarismo balançou o rabinho, fez festinha para Trump e até ganhou alguns biscroks dele ao conseguir que autoridades sofressem sanções com a Lei Magnitsky. Mas nada além disso. A realidade dos fatos se impôs e as fantasias bolsonaristas foram barradas das negociações.
Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo continuarão vivendo de migalhas que alimentam suas narrativas delirantes. Mas agora a conversa será entre os adultos, as crianças birrentas e suas demandas ficam de fora. Dá pra dizer com tranquilidade que hoje é mais fácil o Eduardo Bolsonaro ser deportado do que um porta-aviões aparecer no Lago Paranoá.
(THE INTERCEPT)
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