Dilma anuncia medidas contra miséria: fim do cinismo


Para a Presidente Dilma Roussef, conviver com a pobreza não é realismo, é cinismo. Para Marize Prazeres, beneficiária do Bolsa Família, “é preciso de quem acredite na gente para que possamos vencer todos juntos”. Para a ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campelo, os 16,2 milhões de brasileiros que vivem na pobreza não são estatísticas, eles terão nome, endereço e assistência. As falas marcaram o lançamento do Plano Brasil sem Miséria, nesta quinta-feira (2), em Brasília.

Dilma anuncia medidas contra miséria: fim do cinismo

Em um longo discurso, pontuada por referências históricas e emocionais, a Presidente Dilma disse que o plano de eliminar a pobreza no Brasil é uma grande desafio, mas destacou que “desafios é o que me fizeram avançar na vida. Não podemos ser refém do medo ou da timidez. Devemos ser refém dos nosso sonhos e compromissos com o Brasil”.


Ela enfatizou os aspectos políticos do plano, cabendo à ministra Tereza Campelo, o detalhamento técnico das medidas que terão três eixos: a transferência de renda, o estímulo à produção agrícola no campo e a qualificação profissional na cidade. 

Para o prefeito de Aracaju (SE), Edvaldo Nogueira, que falou em nome dos prefeitos, o programa representa uma nova abolição. “Pela primeira vez na história do Brasil, o país se desenvolve com distribuição de renda. Apesar do esforço de 2002 a 2010, quando milhares de pessoas saíram da pobreza, ainda temos muitas pobreza”, disse o prefeito, lembrando que o Nordeste tem 59% dos pobres do país. 

“O Programa Brasil sem Miséria representa uma nova abolição, abolição da miséria e da pobreza, e uma nova construção do país”, disse ainda Nogueira, anunciando a disposição de todos os prefeitos brasileiros em colaborar com o plano, principalmente na busca ativa, que representa a principal novidade.

Nova forma de atuação

“Vamos mudar a forma de atuar, não é o mais o pobre correndo atrás do Estado, mas o Estado chegando até os extremamente pobres”, explicou a ministra, destacando que essas pessoas vivem em regiões isolados ou, em função de pobreza, migram com frequência em busca de sobrevivência. 

O Censo de 2010 demonstrou que 16,2 milhões de brasileiros vivem em situação de miséria, com renda per capita inferior a R$70 reais por mês. Do total, 76% vivem nas regiões Norte e Nordeste, mais da metade tem menos de 19 anos e 71% são negros e os piores atendimentos de serviço público se concentram nesses segmentos. 

Esses indicadores justificaram a elaboração do programa que pretende conhecer, por meio d e mecanismos de busca, todas essas pessoas, identificá-las por nomes e endereço e incluí-las nos programas já existentes do governo e nas ações do Plano Brasil Sem Miséria. “A renda é forte fator de exclusão e servirá como referência, mas precisamos garantir condições mínimas de vida”, disse Campelo, anunciando as ações que vão garantir renda mínima, água, luz, saúde, moradia e trabalho a essas pessoas.

“Não estamos falando de estatística, mas de famílias, com nomes e endereços”, repetiu a ministra ao longo de seu discurso, fala repetida pela Presidente Dilma. 

De Presidente para Presidente

Marize Prazeres, beneficiária do Bolsa Família e hoje presidente da Cooperativa de Costureiras de Osasco (SP), que falou na solenidade, disse que antes do Bolsa Família era apenas uma dona de casa, casada, 40 anos, mãe de quatro filhos, natural de Alagoas e que migrou para São Paulo. Depois do Bolsa Famílias, aprendeu a ser cidadã e, em contato com outras pessoas, conheceu novos campos de atuação. Ela contou que a partir do programa conheceu o projeto de oficina escola, onde aprendeu a costurar, e depois o projeto de economia solidária, onde aprendeu a cuidar de uma empresa e, em 2007 fundou, junto com outras 47 pessoas, criaram a cooperativa.

“Hoje ficaram 14 pessoas e estamos firmes, podemos participar de licitação, confeccionamos uniformes escolares, camisetas, sacolas”, disse Prazeres, e, dirigindo-se a platéia formada por prefeitos e governadores, fez a propaganda do negócio: “Podem nos convidar (para as licitações)”, arrancando aplausos do públicos, composto ainda de ministros e parlamentares. 

E acrescentou: “Agora podemos nos tratar de igual para igual, porque somos iguais”. E, dirigindo-se à Presidente Dilma Rousseff, disse que falava de presidente para presidente: “Se acreditar que somos capazes, nós podemos provar que somos capazes. É preciso de quem acredite na gente para que possamos vencer todos juntos. Estamos falando de presidente para presidente”, afirmou. 

Medidas práticas

Além dos discursos, a solenidade foi marcada pela assinatura de convênios, Medidas Provisórias (MPs), decretos e do próprio plano. O governo assinou um convênio com a Associação Brasileira de Supermercados para ações articuladas para comercialização de produtos das pessoas do campo e da capacitação e contratação das pessoas nas cidades atendidas pelo programa.

O presidente da Associação Brasileira de Supermercados, Sussumu Honda, disse que “25 milhões de pessoas adentram nossas lojas diariamente, essa é uma oportunidade ímpar de integrar consumidores com ações estratégicas desse governo”, com capacitação de mão de obra, inserção dessa mão de obra e aquisição da produção do campo. “Vamos trabalhar juntos. Esse desafio também é nosso”, afirmou Honda à Presidente Dilma.

O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), que falou em nome dos governadores, disse que “para quem foi para rua com a senhora pedir voto ao povo brasileiro, dizer que a senhora seria a continuação e aperfeiçoamento das conquistas do Presidente e Lula, estamos lavando a alma hoje”. Disse ainda que o programa tem vários méritos, entre eles o estar articulado com todos os ministérios, os governos estaduais e municipais.

“Como disse o prefeito de Aracaju, os prefeitos temos muito a fazer, convocar os governadores para suplementar o programa que a senhora lança hoje. Não há país desenvolvido com miséria, com gente passando necessidade”, disse Cabral.

Portas abertas

A Presidente Dilma disse, em seu discurso, que “o Brasil abriu muitas portas, mas para outros deixou as portas ostensivamente fechadas (...) Nada, nada mesmo vai alterar a nossa proposta de abrir essa porta”. Elogiou o ex-Presidente Lula , que tem o mérito de saber que enquanto não incluísse todos os brasileiros não seríamos uma grande nação. “É imprescindível incorporar todos os brasileiros na construção do Brasil. Sem eles, o nosso futuro estaria irremediavelmente comprometido, preso no círculo vicioso de crescer e não ter sustentabilidade”, afirmou.

“Prefeito Edvaldo muitas mãos estiveram, inclusive a sua, nesse ato de abolição”, disse a Presidente, destacando que “o plano traz para a pauta de todos os governos o compromisso e a determinação de lutar para que o Brasil não tenha mais miséria (aplausos). Dela não podemos nos esquecer um só minuto enquanto governarmos, e fazer todo o esforço para superá-la, acrescentando que “a pobreza levou muito tempo para se tornar um tema para entrar na pauta política e fazer parte do debate, para que o combate se convertesse em politica prioritária de governo”.

Culpa dos pobres

A Presidente Dilma fez uma crítica aos governantes que viam a pobreza com fatalismo. E elogiou a todos que ao longo de vida lutaram contra ela. “Os nossos pobres foram acusados de tudo, inclusive responsáveis de sua própria pobreza”, disse, lembrando que ao longo dos tempos foram levantadas teorias de que a causa da pobreza no Brasil era o clima tropical e a miscigenação”.

“Já disseram que uma das causas era a escravidão, mas a escravidão passou e a falta de vontade política ultrapassou a escravidão”, afirmou, lembrando ainda que “pessoas bem intencionadas, mas equivocadas”, alegavam até a predestinação a pobreza nos países não desenvolvidos. “Milhares de seres humanos nasceram para serem párias eternos, não era necessário fazer esforço para tirar os pobres da sua condição porque era causa perdida”, disse ainda Dilma Rousseff. 

Segundo ela, essas pessoas eram “cegos” “para milhões de brasileiros que morriam de fome e sede, se atiraram em caravanas para o Sudeste ou seringais. Era pobreza se ampliando e redesenhando nosso mapa nacional com traços de tristeza, angústia e desespero”. 

E destacou “aqueles que remaram contra essa maré, desde os abolicionistas do século 19 até os movimentos sociais e sindicais do século 20, pensadores, intelectuais, políticos e lideranças socialmente comprometidas, que contribuíram para que chegássemos até aqui”.

Vozes que ecoam

“O plano evoca a voz desse povo”, citando nomes como Paulo Freite, Anísio Teixeira, Florestan Fernandes, Darcy Ribeiro, Betinho e o Presidente Lula. “Eles reduziram a pó as teorias fatalistas da pobreza no Brasil (...) Ecoa a voz suave de Betinho, que na década de 1970 gritou com aquela santa indignação ‘ação, ação, ação’, enquanto se discute a melhor maneira de salvar o Brasil, milhões morrem de fome”.

E concluiu que “sem apelo e sem dramatizar a miséria, queremos propor oportunidades concretas com o Brasil sem Miséria”, acrescentando que “o programa faz parte de uma cadeia cujos elos são o PAC, o Minha casa, Minha Vida, os programas da saúdes para mencionar alguns, alimentado por uma política econômica de controle de inflação, geração de emprego, que dá sustentação e é sustentado pela política social, que tem por base a distribuição de renda, um círculo virtuoso que nos fez chegar aqui e vai continuar nos conduzindo a um desenvolvimento maior”, disse, anunciando que tem “energia e força” para isso. 

De Brasília
Márcia Xavier
http://www.vermelho.org.br

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