O universo do cristianismo e da espiritualidade está de luto. Faleceu nesta sexta-feira, aos 75 anos, Manoel de Albuquerque Fontinele, um verdadeiro herói da vida real e propagador incansável da fé. Sua partida deixa um vazio irreparável na vida de sua família, amigos e de todos que tiveram o privilégio de conhecê-lo. Mas deixa também um legado eterno de coragem, solidariedade e amor ao próximo.
Mesmo em seus últimos momentos de vida, já deitado em sua cama e com o corpo fragilizado, Fontinele ainda encontrava forças para falar da grandeza de Deus. Enquanto sua boca conseguia se mover, pregava sobre a salvação e a importância de buscar a luz divina. “Ele queria salvar almas até o fim”, contam familiares com lágrimas nos olhos.
Uma infância marcada por dor, coragem e esperança
Nascido no isolado município de Jordão, interior profundo do Acre, Fontinele perdeu os pais ainda criança. Com poucos anos de idade e sem tempo para o luto, teve que se tornar pai de seus próprios irmãos. Com a floresta por testemunha, decidiu que não permitiria que a pobreza e o abandono fossem o fim da sua história.
Sem acesso a transporte e diante de uma realidade implacável, o pequeno Manoel construiu com as próprias mãos uma ubá — pequena embarcação artesanal de madeira — colocou os irmãos dentro e, com fé e determinação, desceu o Rio Tarauacá rumo à cidade de Tarauacá. Foram dias navegando pelas águas barrentas da Amazônia, com fome, frio e esperança no coração.
Trabalho, família e fé: pilares de uma vida dedicada ao bem
Chegando à cidade ainda muito jovem, sem conhecer ninguém, trabalhou dia e noite para garantir o básico aos irmãos. Quando se tornou adulto, retornou para a floresta, desta vez rumo ao seringal Vitória Nova, no alto Rio Muru, para cortar seringa. Foi lá que conheceu o grande amor da sua vida, Maria Helena Andrade de Sousa, com quem se casou e construiu uma linda família.
Com espírito empreendedor, mesmo em tempos difíceis, montou pequenos comércios, vendendo o que podia para garantir o sustento da família. Nos seus últimos dias de vida, já sem condições físicas e sem necessidade financeira, ainda mantinha um pequeno comércio no próprio quarto — como símbolo de dignidade e propósito.
Fontinele não criou apenas seus irmãos e filhos. Criou também sobrinhos, netos e acolheu dezenas de outras pessoas ao longo da vida. Trabalhava incansavelmente para manter sua família unida e protegida. Amava crianças com um carinho quase sagrado. Nunca faltava um saco de bombons em sua casa para distribuir sorrisos.
Um chamado espiritual
Ainda jovem, teve uma visão com um missionário que caminhava pelo mundo pregando o Evangelho. Esse sonho o marcou profundamente. Anos mais tarde, conheceu o Santo Daime e, ao tomar a bebida, reconheceu: o missionário do sonho era Irmão José da Cruz.
Determinado a encontrá-lo, partiu em peregrinação pela floresta. Por dias caminhou mata adentro até a comunidade Santa Cruz, no Rio Envira, onde funcionava uma igreja fundada por Irmão José. Ao chegar, soube que ele já havia falecido, mas conheceu seu discípulo, o senhor José, com quem criou uma profunda amizade espiritual.
Desde então, Fontinele tornou-se frequentador assíduo da comunidade Santa Cruz. Sempre que possível, viajava para lá, e por muitas vezes recebeu a comitiva da igreja em sua própria casa. Era um devoto disciplinado: todos os dias, pela manhã e à tarde, vestia sua batina, orava e entoava hinos com fervor.
Um legado que ecoa na eternidade
Manoel de Albuquerque Fontinele faleceu no dia 20 de junho de 2025, cercado por sua esposa, filhos, netos e bisnetos. Partiu como viveu: com fé, simplicidade e amor.
Seu nome jamais será esquecido por aqueles que cruzaram seu caminho. Seu exemplo de superação, coragem, entrega familiar e fidelidade a Deus continuará ecoando pelos rios, seringais, igrejas e corações da floresta.
Hoje o céu recebe um homem justo. E a Terra despede-se de um gigante.
Descanse em paz, Manoel Fontinele. O Reino dos Céus, que tanto pregaste, agora é tua morada eterna.
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NOTA DE FALECIMENTO