Fascistas têm medo e inveja de artistas

(Foto: Mídia NINJA)

O Marco da Cultura, que tramita na Câmara em comissões e caráter terminativo (não precisará ir a plenário) não vai eliminar as leis do setor já em vigor. Deverá amarrá-las. Objeto reiterado de polêmica e quase sempre vítima de fake news, a Lei de Incentivo à Cultura, a popular Lei Rouanet, continuará a fazer seu papel. Os bolsonaristas poderão prosseguir com os insultos aos artistas que dela dispõem para produzir sua arte.

Explicá-la aos de má fé é perder tempo, aos incautos pode até valer a pena. Os números apurados pela Fundação Getúlio Vargas sobre a Lei Rouanet são estes: a cada 1 real captado e executado, a sociedade recebe de volta 1,59 real. Entre 1993 e 2018, o Governo Federal abdicou, pela Lei, de 31,22 bilhões de reais de arrecadação, mas a economia recebeu uma injeção de 55,78 bilhões.

A perseguição ideológica à Lei Rouanet e aos artistas que buscam captar recursos por seu intermédio deve-se, é claro, ao medo que políticos reacionários sentem de um Chico Buarque de Holanda, de uma Daniella Mercury, de um Caetano Veloso, de uma Tereza Cristina, de um Gregório Duvivier, de um Paulo Betti, de um Zé de Abreu. Tais políticos, aos quais se alia uma pá de jornalistas, são gente com o mesmo espírito dos que destruíram uma tela de Di Cavalcanti na invasão do Palácio do Planalto em 8 de janeiro.

Desde sempre foi assim, mas com Bolsonaro a imbecilidade vitaminou-se. Na verdade, inveja talvez seja uma palavra mais adequada que medo: grandes artistas são objeto de idolatria sincera e reverência incondicional, sonho de todo fascista.

Alguns casos envolvendo a Lei de Incentivo à Cultura nos anos Bolsonaro beiram o surreal. Enquanto o cantor sertanejo conhecido (não por mim) como Zé Neto regozijava-se de não precisar da Lei Rouanet – e recebia um cachê muito acima do seu talento diretamente dos cofres de uma prefeitura, sem licitação ou compromissos de teor social - Maria Bethânia era acusada de tentar embolsar 1 milhão de reais via Lei Rouanet.

Claro que não foi nada disso. Um projeto do diretor de cinema Andrucha Waddington visava a valorizar a poesia e levá-la à massa. Poemas audiovisuais digitais seriam disponibilizados gratuitamente em uma plataforma de internet, lidos por Bethânia. Insultada, ela desistiu de participar do projeto, e até hoje detratores não entenderam que aquele 1 milhão de reais, oriundo do setor privado e compensado pelo Fisco, remuneraria, além dela, diretores, cinegrafistas, programadores, editores e muitos profissionais mais.

Mecanismos semelhantes à Lei de Incentivo à Cultura beneficiam setores de serviços, da indústria, da saúde e da agricultura. A renúncia via Rouanet representa meros 0,48% das renúncias fiscais no Brasil.

O governo Bolsonaro represou valores autorizados de captação via Lei de Incentivo para inúmeros projetos culturais, mas liberou-os em tempo recorde para livros contando a história das armas no Brasil, tendo como “contrapartida social” palestras sobre armas e munições a crianças e adolescentes.

Salvo imprevistos, em breve o Brasil terá o seu Marco Regulatório de Fomento à Cultura - arcabouço que se pretende abrangente e norteador de políticas públicas culturais. O Projeto de Lei 3.905 / 2021, que estabelece o Marco, foi aprovado em caráter conclusivo na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, e portanto não precisa ir a plenário, bastando aprovação na Comissão de Finanças e Tributação, onde se encontra, e na Comissão de Constituição de Justiça antes de ser sancionado e entrar em vigor.

Baixado em março pelo governo Lula, o Decreto 11.453 / 2023 abarca mecanismos de fomento além da Lei Rouanet, como as recentes Leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo. O decreto elimina entraves com que gestores públicos deparam-se para agir nesse campo. Está em funcionamento como um aperitivo do que deverá ser o Marco da Cultura.

fonte: https://www.brasil247.com/
Paulo Henrique Arantes
Jornalista, com mais de 30 anos de experiência nas áreas de política, justiça e saúde.

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