Acampamento Terra Livre (ATL) 2019: Acre, sul do Amazonas e noroeste de Rondônia, realiza debate público sobre políticas indigenistas oficiais e estratégias diante do quadro de ameaças aos direitos indígenas.
Cerca de 70 representantes de povos indígenas no Acre passaram os últimos três dias (24, 25 e 26) em intenso debate no primeiro Acampamento Terra Livre (ATL) no estado, que aconteceu simultaneamente a 15ª edição da ATL nacional, reunindo indígenas de todo o país em Brasília, incluindo uma delegação do Acre.
Realizado no auditório da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Acre (ADUFAC), campus de Rio Branco, o ATL incluiu povos do sul do Amazonas e do noroeste de Rondônia.
Indígenas de outros estados brasileiros também realizaram o ATL local, e no Acre, aldeias se juntaram ao movimento, como a aldeia Apiwtxa na Terra Indígena (TI) Kampa do Rio Amônea.
“Nosso encontro seguiu a agenda nacional do ATL com um olhar para a nossa situação no Acre. Aqui formamos lideranças para que levem para as Terras Indígenas tudo que foi discutido”, explicou Francisco Apurinã, conhecido como Chico Preto.
Enquanto na quinta-feira (25) acontecia o I Encontro de Mulheres Indígenas na capital federal, em Rio Branco realizava-se uma Roda de Conversa com o tema “Mulheres Indígenas: visibilidades, lutas e incompreensões nas políticas públicas, no cenário de desafios interculturais”. A roda foi uma oportunidade para as lideranças femininas planejarem a participação na Marcha da Mulheres Indígenas, que acontecerá em agosto deste ano com o tema “Território: Nosso Corpo, Nosso Espírito!”.
“Fizemos um preparatório para a marcha, que vai representar o nosso repúdio a todo esse retrocesso para mulheres indígenas e não indígenas”, disse Letícia Luiza Yawanawá, coordenadora da Organização de Mulheres Indígenas do Acre, Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia (SITOAKORE). Ela chamou a atenção para a violência contra a mulher indígena que, nas suas palavras, é invisível: “Não se vê um dado oficial sobre esse problema”, acrescentou.
A última roda de conversa do movimento local teve como tema a Educação Indígena. “O Acre é pioneiro na educação escolar indígena no Brasil, outros estados pegaram o nosso exemplo e hoje estão bem adiantados, enquanto nós estamos paralisados”, lamentou Eldo Carlos Shanenawa.
O último curso de formação de professores indígenas foi realizado em 2014 pela Secretaria de Estado da Educação, deixando uma enorme lacuna na maioria das escolas indígenas no Acre.
Além disso, a grande maioria dos profissionais que estão na sala de aula trabalham com contratos temporários de 10 meses.
De acordo com Gleyson Teixeira, coordenador executivo da Comissão Pró-Índio do Acre (CPI- Acre) e do Programa de Educação e Pesquisa Indígena, mais da metade dos quase nove mil alunos indígenas da rede estadual não conseguem avançar nos níveis escolares por falta de estrutura nas escolas.
“Há um déficit muito grande na estrutura das escolas porque não há a continuidade da formação de professores, e como resultado pouca oferta do ensino médio, por exemplo ”, disse Gleyson durante a roda de conversa. “ O governo do Acre deve retomar a formação de professores e promover arranjos interinstitucionais com organizações governamentais e não governamentais para esse objetivo”, concluiu.
Documento do ATL no Acre Nesta sexta,26, as delegações trabalharam na finalização do documento do ATL local que vai cobrar dos governos a efetivação de direitos e a continuidade das políticas públicas para os povos indígenas. Os indígenas também pedem a não paralização da política de gestão territorial e ambiental nas TI no Acre, que possui investimentos internacionais na faixa dos 29 milhões de reais, e que não estão sendo utilizados.
“Já existe uma política territorial que foi muito discutida – a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental [PNGATI] - mas que o atual governo não se esforça para entender. Eles acham que Terra Indígena é só para mineração e exploração de madeireira, mas isso não faz parte das nossas vidas”, conta Francisco Apurinã.
O documento do ATL no Acre será divulgado e protocolado em instâncias públicas estaduais e federais na próxima semana, alinhando-se e fortalecendo as principais reivindicações do ATL nacional no documento final “Resistimos há 519 anos e continuaremos resistindo”. O texto resgata o histórico dos direitos originários e constitucionais e exige que esses direitos sejam respeitados, conforme a Constituição Federal.
Por Leilane Marinho
Comunicação/CPI-Acre