O líder indígena Benki Piãnco, da etnia ashaninka, é mais conhecido mundialmente, na atualidade, do que era Chico Mendes quando foi assassinado em Xapuri (AC), em 1988. Portanto, é preciso muita vigilância para evitar que a ameaça de morte contra ele seja executada. Apenas a retirada da arma do policial de Mal. Thaumaturgo que o ameaça não afasta o perigo do assassinato.
Leia o relato inical do antropólogo Domingos Silva:
"Atentado contra Benki Pyanko em Marechal Thaumaturgo:
Recebi há pouco uma mensagem tensa de amigos de Cruzeiro do Sul, sobre um incidente ocorrido ontem na Terra Indígena Kampa, em Marechal Thaumaturgo, no Estado do Acre.
Ao longo do tempo tem havido inúmeros relatos de tensão entre policiais e os Ashaninka de Marechal, mas dessa vez parece que a situação extrapolou o tênue limite da civilidade democrática.
Mas ontem, dia 25 de Fevereiro, foi o aniversário do Benki, famoso mundialmente por seu papel na proteção das terras indígenas, e na busca incansável de equilíbrio entre a exploração consciente dos recursos da floresta, e sua permanente conversação, através de programas de manejo florestal, repovoamento de peixes, oficinas de conscientização ao redor do mundo, bem como na divulgação e no zelo com as chamadas medicinas da floresta, entre muitas outras muitas atividades similares.
A festa aconteceu em sua casa na aldeia, junto de seus inúmeros amigos e convidados vindos de várias partes, inclusive de Marechal Thaumaturgo. E entre eles estava o agente da Polícia Civil José Francisco Bezerra de Menezes, um dos dois agentes policiais da cidade. Segundo meus informantes, José Francisco é parente do ex-prefeito e sempre ameaçou os Ashaninka. O relato sobre o acontecido é surpreendente:
"O José Bezerra já chegou na festa do Benki bêbado e o ameaçou, junto de sua família, com uma arma de fogo. Depois ficou mostrando a arma e quase aconteceu uma tragédia. Não fizemos imagens porque ele ficou perigoso, e ficamos com medo porque ele estava violento, mas temos mais de 50 testemunhas do ocorrido.
Por fim, depois de muita persuasão, conseguimos fazer com que ele saísse em paz, mas ele saiu ameaçando e estamos preocupados que ele possa fazer algo mais. Enquanto não conseguimos enviar algo por escrito devido a internet ruim, queremos pelo menos fazer essa denuncia chegar nos ouvidos certos.
Ele é perigoso, estava altamente bêbado e manuseando a arma na frente de todos, e quase tivemos uma tragédia. O pessoal da festa quis partir pra cima dele, mas já pensou na tragédia que seria? Sorte que conseguimos acalmar a situação e os amigos que o acompanhavam o tiraram dali.
Mas ele, ao chegar no porto da casa do Benki, sacou da arma e disparou. O que queremos nesse momento é que isso chegue aos ouvidos do governo do Estado do Acre".
Não é a primeira vez que temos notícias desse enfrentamento entre os indígenas e autoridades policiais de Marechal Thaumaturgo, e talvez seja o momento do Governo do Estado, sempre sensível a problemática dos povos indígenas, tomar conhecimento e medidas a respeito."
ATUALIZAÇÃO:
Recebi do jornalista Altino Machado a seguinte mensagem:
Do delegado-geral de Polícia Civil do Acre, José Henrique Maciel, após a leitura do relato do antropólogo Domingos Bueno:
- Boa tarde, Altino. Vamos começar a apuração agora com a abertura de procedimento administrativo e criminal via Corregedoria, incluindo o afastamento das funções e recolhimento da arma do policial. Já até conversei com a corregedora-adjunta. Tudo será apurado e as providências adotadas. Nada ficará impune.
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Veja agora reportagem do Estadão, publicada em 17 de março de 2018, com o título "Liderança indígena é acusada de denúncia caluniosa após relatar ameaças de madeireiros":
"Depois da execução da vereadora Marielle Franco, o que mais mobilizou as redes sociais das quais participo foi a possibilidade de prisão de Benki Piyako, liderança indígena do povo Ashaninka e respeitado internacionalmente pelo seu trabalho e luta incessante pela proteção da Amazônia. As mensagens de apoio a Benki chegaram por todos os lados e um abaixo-assinado está circulando na internet para que o caso possa ser revertido.
Benki, que fala para o mundo sobre a importância da preservação da floresta - e é escutado por ele - passou de vítima a acusado após algumas trapalhadas jurídicas que agora podem condená-lo criminalmente por denúncia caluniosa.
A liderança, junto com seus irmãos e irmãs, desenvolvem um trabalho de reflorestamento junto às comunidades da Reserva Extrativista (Resex) Alto Juruá, a primeira criada no Brasil após o assassinato do líder seringueiro Chico Mendes, localizada no município de Marechal Thaumaturgo, no Estado do Acre, quase na divisa com o Peru, e as atividades vêm mudando a realidade dos moradores. Um dos irmãos, Isaac Piyako é o prefeito de Marechal Thaumaturgo e foi o primeiro prefeito indígena do Acre.
A história é mais ou menos assim: Após conflitos por ocupação de terra na cidade de Marechal Thaumaturgo em abril de 2015, Benki fez denúncia à Polícia Federal para relatar os riscos de violência que estava sofrendo em razão de sua atuação como agente agroflorestal e líder da Associação dos Ashaninka do Rio Amônia, a Apiwtxa ( a palavra significa "união" na língua Aruak).
Os responsáveis pela investigação do caso foram até a sede do município e, após ouvir apenas os acusados, decidiram por arquivar a denúncia. Sem ouvir Benki ou qualquer uma das pessoas da associação, segundo os advogados que cuidam do caso, a autoridade policial o indiciou e pediu a abertura de ação penal, contra o próprio indígena, pelo crime de denunciação caluniosa.
O Ministério Público Estadual do Acre aceitou o indiciamento e propôs ação penal contra ele. O processo tramita na 1ª Vara Criminal da Comarca de Cruzeiro do Sul (AC), está em fase de alegações finais para defesa e acusação e será julgado em breve.
Segundo o advogado do caso, Antonio Rodrigo Machado, "Benki procurou o Estado brasileiro para receber proteção das forças policiais e, em sentido oposto, está sentado no banco dos réus, acusado de um crime que não cometeu. Ao ser escolhido pela seletividade do sistema criminal brasileiro, não é apenas a liberdade de Benki que está em risco, mas sim o próprio respeito desse país aos Povos da Floresta e toda sua cultura".
Benki integra a lista de ameaçados de morte da Organização das Nações Unidas (ONU), já sofreu seis atentados à bala e um a machadada, sendo essa última em 2015 e vídeo do cineasta Vincent Carelli compartilhado nas redes sociais mostra a chegada de Benki na aldeia com o rosto ferido para ver os familiares. De acordo com relatório da Global Witness, o ataque à riqueza natural da nossa floresta faz do Brasil o país mais mortal do mundo com 132 defensores assassinados desde quando a série começou, em 2015. E os dados não estão atualizados.
O trabalho dos Ashaninka incomoda garimpeiros e madeireiros, que enxergam sua atuação como uma ameaça às atividades ilegais. E isso não é de hoje. A história desse povo é desde sempre ligada ao combate aos madeireiros e narcotraficantes e esse espaço seria pequeno para contar toda a história dos Ashaninka na batalha ao desmatamento e na luta para que não fossem dizimados.
A Terra Indígena onde eles moram foi demarcada há 25 anos e o que eles receberam da mão do governo era uma fazenda e no lugar da floresta, capim. Árvores foram plantadas, a floresta reestabelecida, a cultura preservada e os Ashaninka são hoje o símbolo da resistência e verdadeiros garotos-propaganda do estado do Acre, que se auto-intitula como o governo da floresta. O senador Jorge Viana (PT) afirma que busca mediar uma solução com o Ministério Público do Estado e que se trata de uma ação equivocada disparada pela Polícia Federal.
Em um país como o nosso, que lidera o ranking mundial contra os defensores do meio ambiente, a atuação dos Ashaninka foi uma das 15 iniciativas vencedoras do Prêmio Equatorial promovido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o Pnud, no ano passado, que consagrou soluções sustentáveis para desafios voltados à proteção e promoção de pessoas, comunidades e do meio ambiente. Foram mais de 800 inscrições, vindas de 120 países. No Brasil, duas associações indígenas foram as selecionadas. E os Ashaninka estavam lá."
Foto: Altino Machado
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