Suprema Corte do México libera uso recreativo da maconha

Uma maioria qualificada votou por declarar a inconstitucionalidade de artigos da lei que proíbem cultivar, colher, transportar e distribuir a substância entre particulares.


Um ativista do Plantón420 fuma um cigarro de maconha em protesto para exigir a regularização de seu consumo.CARLOS RAMÍREZ / EFE

O plenário do Tribunal Constitucional do México aprovou uma Declaratória Geral de Inconstitucionalidade de alguns artigos que impedem o consumo, a aquisição de sementes, plantio e a distribuição da maconha. Oito ministros, maioria qualificada, votaram a favor do projeto e três, contra. Esses artigos proibitivos já haviam sido declarados inconstitucionais no passado, por isso o Congresso tinha a obrigação de eliminá-los ou modificá-los, mas não o fez, apesar de terem ocorrido três prorrogações para que tomasse essa medida. Por essa razão, houve o recurso à declaração geral de inconstitucionalidade, um dispositivo que só havia sido utilizado uma vez. O presidente da suprema corte do país descreveu a consolidação do livre desenvolvimento da personalidade no uso recreativo da cannabis como “um dia histórico para as liberdades”.

A decisão do plenário insta a Secretaria Geral da Saúde (pasta ministerial) a emitir autorizações para que adultos possam plantar, colher, transportar e consumir cannabis, desde que o Congresso legisle adequadamente a respeito. Ou mesmo que não o faça. Além disso, a Comissão Federal de Proteção contra Riscos (Cofepris) deverá estabelecer as diretrizes para a aquisição de sementes e especificar que o consumo desta droga não pode ser feito afetando terceiros nem em locais públicos nos quais os demais presentes não tenham dado sua autorização. Da mesma forma, devem ser incluídas as salvaguardas de não dirigir nem operar máquinas ou realizar qualquer atividade que possa pôr terceiros em risco ou causar danos. Esses são os aspectos que também foram aprovados em plenário. Quando a matéria for publicada no Diário Oficial da Federação, a Secretaria Geral da Saúde deverá expedir permissões aos cidadãos, que não terão mais que interpor um recurso para isso, como vinha sendo feito até agora, o que havia sido qualificado por alguns magistrados como discriminatório para os cidadãos que não dispõem de recursos jurídicos.

“Tem que ficar bem claro que o Código Penal não foi alterado, portanto, os crimes ainda estão em vigor, as pessoas podem continuar sendo perseguidas por tráfico de drogas”, observou a diretora-geral do México Unido contra a Delinquência, Lisa Sánchez, que promoveu e venceu todos os cinco julgamentos desta causa. Para ela, o que aconteceu nesta segunda-feira também é histórico, pois “é a segunda vez que é utilizada no país a Declaração Geral de Inconstitucionalidade, consistente com a jurisprudência anterior”. De resto, diz ela, continuamos no mesmo lugar de antes, só que não será mais necessária a interposição se recurso para poder cultivar e consumir, somente a autorização da Cofepris. “Cabe aos congressistas definirem a melhor forma de emitir as licenças, as quantidades, os espaços de consumo. Devem legislar sobre isso”, afirma. Mas o Congresso poderia deixar as coisas como estão, nas mãos da Secretaria da Saúde, conforme a determinação da Suprema Corte, e não fazer uma lei sobre a cannabis. “A criação de um mercado legal de maconha ainda depende do Congresso”, acrescenta. O tribunal, neste caso, atuou como legislador negativo. Retira esses artigos da lei, mas não pode redigir outros.


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O uso recreativo da maconha no México era uma demanda havia muito tempo por parte de certos grupos, que alegavam o direito ao livre desenvolvimento da personalidade. O tribunal já se havia pronunciado sobre a inexistência de riscos coletivos à saúde no consumo privado dessa substância, em uma espécie de equiparação com as demais drogas lícitas, como o álcool e o tabaco. E a primeira câmara do tribunal estabeleceu em 2017 a inconstitucionalidade dos artigos que declaravam a proibição absoluta do consumo. O Congresso modificou alguns artigos que abriam caminho para o uso terapêutico do tetra-hidrocanabinol (THC), mas os grupos demandantes consideravam que estava sendo regulamentado um mercado, e não a liberdade pessoal, que era o que requeriam. E o protesto continuou com vigílias de rua, em frente ao Senado, e nos últimos dias em frente à Suprema Corte.

Na manhã desta segunda-feira, o grupo Plantón420 havia pedido aos ministros que votassem sem medo a Declaração Geral de Inconstitucionalidade, e isso finalmente aconteceu. E eles festejaram, mas com muita cautela. Estão esperando para ver como a medida se concretizará, como se legislará a respeito. “Nos alegra, mas estamos atentos aos detalhes que ainda não se conhecem. A inconstitucionalidade já ocorreu, é uma grande batalha vencida”, disse Hugo Legorreta, um dos porta-vozes do Plantón420, entidade que luta pela liberdade de consumo privado. “É um dia histórico, sim, o México se pronunciou por uma visão de direitos humanos e de garantias de acesso a vários direitos, como o do livre desenvolvimento da personalidade. Em nenhum outro país isso acontece, todos os outros regularam os mercados. Agora precisamos saber o que os deputados farão, porque já vimos que eles são especialistas em procrastinar e delegar. Houve várias prorrogações e não legislaram”, acrescentou Legorreta. “Na Colômbia e na África do Sul também foram conquistadas algumas liberdades com a intervenção do tribunal”, acrescentou Lisa Sánchez.

O grupo Plantón420 ainda tem demandas não atendidas, como a do livre cultivo e da posse ilimitada quando não houver fim lucrativo, e a da criação de espaços para compartilhar com os fumantes de tabaco. “Faltam ainda muitas coisas, continuamos na luta, o plantão em frente ao Senado não vai sair dali. Agora, além disso, os Estados têm que ir completando a regulamentação, indicando espaços para consumo, quantidades etc.”, afirmou Legorreta.

A declaração foi histórica, mas agora o México terá que aguardar a implementação da ordem do tribunal. As licenças exigirão que o plantio e o consumo sejam nas condições que forem estabelecidas.


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Fonte: ElPaísBrasil

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