O Teatro José Potyguara, de Tarauacá, completa neste domingo (26), 87 anos de existência. É o mais antigo teatro do Acre, inaugurado em 26 de janeiro de 1933. Teve como figuras centrais, em seu início, o escritor José Potyguara e o maestro Mozart Donizetti, autor da música do Hino Acreano.
Atualmente, o Teatro encontra-se em estado de precariedade, quase abandono, sem condições adequadas para uso, com janelas, poltronas, piso e tábuas deterioradas, além de telhas, aos fundos, caídas.
A HISTÓRIA DO TEATRO
Por Isaac Melo, ganhador da medalha Mário de Andrade do IPHAN
Numa quinta-feira, debaixo de uma chuva torrencial, às nove horas da manhã, diante de uma plateia seleta, era inaugurado o “Theatro Municipal” de Tarauacá, “obra grandiosa para Seabra e construída com todos os requisitos da moderna arquitetura”, conforme noticiou um jornal da época. Era o dia 26 de janeiro de 1933.
A obra, surgida do anseio da elite local, foi construída na administração de José Florêncio da Cunha, o Cazuzinha, prefeito do município de 1930 a 1934. Cazuzinha havia fundado, em 1918, um dos mais duradouros e importantes jornais da cidade, A Reforma, que circulou até 1938. Ele também era avô do médico e escritor Djalma Batista.
O projeto arquitetônico do teatro foi elaborado por José Potyguara, então promotor de Justiça. O prédio, de construção mista, era de madeira de lei sobre base de alvenaria, medindo, conforme dados da época, “40 palmos de frente por 100 palmos de fundo, contendo um vestíbulo (terraço aberto em arcadas) de 20 palmos; um salão de 50 palmos; caixa de Teatro com palco e camarins”.
A construção, também sob a direção de Potyguara, foi executada na parte de alvenaria pelo “competente artista Sebastião Alves Maia”, português que viveu muitos anos em Tarauacá, responsável por construir os primeiros prédios em alvenaria da cidade, falecido em Manaus em 1934.
Três dias depois da inauguração, isto é, 29 de janeiro de 1933, estreou a primeira peça, chamada “Razões do coração”, um “melodrama” de autoria de José Potyguara, com os números musicais a cargo de Mozart Donizetti, autor da música do hino acreano, então professor de música da cidade e maestro da Banda Nepomuceno, responsável por animar a vida social da cidade, com as animadas retretas. Potyguara e Donizetti eram cearenses de Sobral, e foram personagens importantes da vida cultural, musical e literária de Tarauacá em fins da década de 1920 e dos primeiros anos da de 1930. Lamentavelmente, Donizetti veio a cometer suicídio em 1936, ao mudar para Cruzeiro do Sul.
O Teatro, todavia, não ficou sob a responsabilidade da Prefeitura, que o arrendou em seguida à “Sociedade Sportiva e Dramática Tarauacaense”, uma agremiação que havia sido fundada em 1925 e que muito contribuiu para a vida cultural dos seabrenses.
À época do surgimento do Teatro, Tarauacá não contava mais que dois mil habitantes. Estava-se ainda em plena crise da borracha, que só ganharia novo fôlego a partir de 1942, sob os efeitos da II Guerra Mundial e os chamados “Acordos de Washington”. O Território do Acre era governado pelo Interventor Assis Vasconcelos, e estávamos nos anos iniciais da Era Vargas.
O Teatro, inicialmente, teria cobertura de palha, mas dada às críticas recebidas, “uma nota dissonante na plástica”, conforme se dizia, foi finalmente coberto de telhas.
Ao longo dos anos, o Teatro tornou-se o principal ponto de convergência da pequena elite local, lugar onde se realizava os principais eventos, de saraus aos concorridos e animados bailes. Já na década de 1970 (18/06/1975), funcionou nas dependências do Teatro a “Rádio Educadora 15 de Junho”, que aí ficou até 1981. Também aí funcionou um cinema.
A partir da década de 1990, o Teatro começa a perder fôlego e a estrutura começa a ruir, mesmo tendo sido tombado, em 1994, como patrimônio histórico do Município, na gestão de Cleudon Rocha. Só em 1999, na gestão de Jasone Ferreira da Silva, o Teatro foi recuperado, a partir de um convênio com o Ministério da Cultura. Desde então, o teatro nunca mais recebeu uma recuperação geral, a não ser reparos paliativos, ao longo das administrações, que, em sua maioria, o ignoraram (e ignoram), tanto do ponto de vista cultural quanto histórico.
Depois dos anos 2000, o Teatro ainda teve atividade, com a realização, inclusive, de festivais de teatros e apresentações musicais e de dança. Além, é claro, das costumeiras reuniões e convenções políticas.
O Teatro Municipal de Tarauacá passou a ser denominado “Teatro José Potyguara” a partir de uma sugestão do historiador e empresário tarauacaense João Maia. José Potyguara, como já ressaltamos, nasceu em Sobral-CE, em 1909, formou-se em Direito, e, em 1928, chegou ao Acre, nomeado como promotor público de Justiça. Escreveu quatro livros, e faleceu no Rio de Janeiro, em 1991. Seu pai, Hipólito de Albuquerque e Silva, foi um dos pioneiros da região, e prefeito da cidade em diversas ocasiões.
O Teatro José Potyguara, obviamente, não é o primeiro, mas é o mais antigo teatro do Acre. Porém não é tombado como patrimônio histórico do Estado. Apesar da sua importância, sobretudo, cultural e histórica segue, ao longo dos anos, entre descasos e abandonos. Resiste! Mas até quando?
Por Isaac Melo
Ganhador da medalha Mário de Andrade do IPHAN