TARAUACÁ: JUSTIÇA SUSPENDE CONCURSO PUBLICO DA PREFEITURA PREVISTO PARA SER REALIZADO NO PRÓXIMO DOMINGO


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO ACRE 
Vara Cível da Comarca de Tarauacá

Autos n.º 0700487-24.2016.8.01.0014 
Autos n.º 0700487-24.2016.8.01.0014 
Classe Ação Popular 
Requerente Diana Maria de Sá Oliveira 
Requerido Prefeitura Municipal de Tarauaca 


Decisão 

Trata-se de ação popular interposta por Diana Maria de Sá Oliveira em face do Prefeito Municipal de Tarauacá visando anular ato lesivo ao patrimônio público. Aduz a autora que fora realizado concurso público pela Prefeitura do Município de Tarauacá, para provimento de vagas no âmbito da Secretaria Municipal, no dia 03 de abril de 2016, tendo sido o certame, organizado pela empresa Calegáriox Assessoria, Consultoria e Corretagem de Seguros Ltda. 

O edital do concurso previa vagas para os cargos de Assistente Social, Auditor de Controle Interno, Auditor Fiscal, Enfermeiro, Farmacêutico/Bioquímico, Fisioterapeuta, Médico, Nutricionista, Odontólogo, Profissional de Educação Física, Psicólogo, Técnico de Análises Clínicas, Técnico de Enfermagem, Agente Comunitário de Saúde, Agente de Endemias, Auxiliar de Controle Interno, Auxiliar de Saúde Bucal e Fiscal Sanitário. 

Sucede que, na realização das provas, ocorreram os seguintes fatos: a prova aplicada para o cargo de Enfermagem fora plagiada de um concurso realizado na universidade de Santa Catarina; as provas aplicadas para os cargos de Técnico em Saúde Bucal, Técnico de Análises Clínicas, Técnico de Enfermagem, Agente de Endemias, Auxiliar de Controle Interno e Fiscal Sanitário foram aplicadas aos candidatos nos turnos manhã e tarde e possuíam questões idênticas. 

Por tais motivos, o Prefeito de Tarauacá, por meio do Decreto nº 031/2016, decidiu pela nulidade de todos os exames aplicados no âmbito do Concurso Público, bem como de todos os atos dele consequentes, sobretudo os resultados obtidos, ainda que não divulgados. Este documento foi liberado nos autos em 15/09/2016 às 09:39, é cópia do original assinado digitalmente por GUILHERME APARECIDO DO NASCIMENTO FRAGA. Para conferir o original, acesse o site http://esaj.tjac.jus.br/esaj, informe o processo 0700487-24.2016.8.01.0014 e código 158B06F. fls. 70 

Este decreto ensejou a impetração do Mandado de Segurança número 0700163-34.2016.8.01.0014, em que tinha como pleito liminar a sustação de seus efeitos, no sentido da não anulação total do certame, permanecendo a declaração de ofício da empresa impetrante para reaplicar as provas inerentes aos cargos de Enfermagem, Técnico em Saúde Bucal, Técnico de Análises Clínicas, Técnico de Enfermagem, Agente de Endemias, Auxiliar de Controle Interno e Fiscal Sanitário e continuar o certame nos seus ulteriores termos.

A decisão judicial negou o pedido liminar e determinou que o Decreto Municipal nº 031/2016 continuasse surtindo efeitos até posterior deliberação do juízo de mérito, ou seja, o certame permaneceria anulado em sua totalidade, não podendo ter andamento até posterior pronunciamento judicial. 

Após essa decisão judicial, a Prefeitura de Tarauacá realizou contrato com a banca examinadora FUNDAPE, para elaborar um edital e realizar um novo concurso com a mesma previsão de cargos e vagas, inclusive havendo a opção de migração dos candidatos que realizaram inscrição no certame anterior. 

Alega que com essa contratação, o Prefeito ignorou totalmente o Mandado de Segurança em andamento, bem como, não se atentou ao fato de que, caso o Mandado de Segurança seja julgado procedente, o Município terá que arcar com os custos do andamento do concurso anterior e com os custos de todo trabalho já realizado pela nova empresa contratada, o que causaria um prejuízo aos cofres públicos. 

Requer que seja deferida a liminar para que seja suspenso o CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS E TÍTULOS PARA PROVIMENTO DE VAGAS EM CARGOS DE NÍVEL SUPERIOR, TÉCNICO, MÉDIO E DE NÍVEL FUNDAMENTAL COMPLETO PARA QUADRO DE PESSOAL DA PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE TARAUACÁ, referente ao Edital 005/2016 da FUNDAPE, até decisão final em sede de Mandado de Segurança nº 0700163-34.2016.8.01.0014. Este é o relato do necessário. Decido. 

Ação popular é o meio processual a que tem direito qualquer cidadão que deseje questionar judicialmente a validade de atos que considera lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Isto é, trata-se de uma demanda que tutela direitos transindividuais. 

Pela possibilidade jurídica, indica-se a exigência de que deve existir, abstratamente, dentro do ordenamento jurídico, um tipo de providência como a que se pede através da ação. Esse requisito, de tal sorte, consiste na prévia verificação que incumbe ao juiz fazer sobre a viabilidade jurídica da pretensão deduzida pela parte em face do direito positivo em vigor. O exame realiza-se, assim, abstrata e idealmente, diante do ordenamento jurídico. Na hipótese, evidencia-se juridicamente possível o pedido de suspensão do concurso, mediante ação popular. 

In casu, verifica-se que a conduta perpetrada pelo Prefeito Municipal descumpridora de decisão judicial maculou indevidamente normas jurídicas que orientam a atividade administrativa e vinculam a atuação do referido agente público, notadamente no que concerne ao vilipêndio formulado contra a moralidade administrativa, capaz de acarretar grave prejuízo ao erário. 

Para o ingresso da ação popular fundada em ato lesivo à moralidade administrativa, a conduta ilícita que é causa de pedir da demanda coletiva não precisa necessariamente impor qualquer dano material ao erário, porquanto tutela-se direito de índole extrapatrimonial e difusa. 

Ao prever ato lesivo à moralidade administrativa como bem imaterial pertencente ao patrimônio público, o constituinte entende que a proteção exclusivamente da moralidade administrativa (que exige da Administração Pública a adoção de padrões éticos e fundados na boa-fé) já é suficiente para se obter a tutela jurídica por meio de ação popular. Não que se dispense a lesividade nesse caso, ou que seja ela presumida, deve-se considerar a moralidade administrativa como bem integrante do patrimônio público, e, por consequência, a mera prática de ato ou omissão contrária à moralidade administrativa já gera a lesão exigida 

Em que pese a requerente não ter demonstrado o efetivo prejuízo ao erário em virtude do ato do Prefeito, é inegável a viabilidade da ação popular preventiva, por meio da qual se busque uma tutela inibitória, pois limitar a ação popular a pretensões reparatórias, voltadas à tutela de um direito já lesionado, não se coaduna com o atual estágio da ciência processual e indevidamente apequena tão importante ação constitucional. Assim, perfeitamente cabível o ingresso desta ação, pois busca evitar um prejuízo econômico aos cofres públicos. 

O ato ora questionado do Prefeito atenta frontalmente à moralidade administrativa, pois viola os preceitos insculpidos no artigo 11 da Lei de Improbidade Administrativa, mormente aqueles contidos nos incisos II e V, uma vez que deixou, dolosa e desidiosamente, de cumprir decisão judicial e frustrou a licitude de concurso público. Vejamos. 

Conforme decisão liminar proferida no mandado de segurança de nº 0700163-34.2016.8.01.0014, interposto pela empresa CalegárioX Assessoria, Consultoria e Corretagem de Seguros Ltda em face do Prefeito do Município de Tarauacá, o Decreto Municipal nº 031/2016 não fora suspenso, ou seja, continuou surtindo efeitos, mantendo as provas anuladas em sua totalidade e suspendendo qualquer ato referente ao certame até posterior deliberação judicial, in verbis: 

Diante do exposto, DENEGO o pedido liminar para que o Decreto Municipal nº 031/2016 continue surtindo efeitos até posterior deliberação do juízo de mérito, eis que a matéria posta à apreciação demandará o contraditório e a realização de prova para constatar o alegado pela autora, bem como, também não se verifica a ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação com a manutenção da vigência do decreto até o desfecho da presente ação. 

Determino que as partes, no prazo de 10 (dez) dias, manifestem-se acerca do cumprimento da decisão liminar proferida no mandado de segurança de nº 0700720-55.2015.8.01.0014, explicando, se for o caso, como que se fizera o pregão, malgrado decisão judicial dispondo em contrário. Sob pena de envio destas informações ao Parquet, para início de persecução criminal de infração prevista no artigo 359, do Código Penal. Cumprida esta liminar, notifique-se a autoridade indicada como coatora para prestar, em 10 (dez) dias, as informações que achar necessárias, nos termos do artigo 7º, inciso I, da Lei nº 12.016/2009. 

Decorrido esse prazo, com ou sem resposta, dê-se vista ao Ministério Público, para apurar eventual prática de improbidade e infrações penais, em razão da conduta dos agentes públicos envolvidos que, conquanto cientes que estariam diretamente envolvidos no processo de homologação do certame, se inscreveram como candidatos; e da banca examinadora (assim como de seus agentes) que, com sua atuação imprudente, desidiosa e improba, frustraram a licitude do concurso público (sem excluir as demais hipóteses previstas nos artigos 9º e 10 da Lei Federal nº 8.429/92). 

Cite-se a Prefeitura Municipal de Tarauacá, para, em querendo, contestar o pedido, no prazo legal. Ao que tudo indica, a decisão retromencionada não fora cumprida, pois o Prefeito Municipal ao seu bel talante contratara outra empresa FUNDAPE para realizar o mesmo concurso público, com a posterior publicação do edital e dos atos subsequentes, sem observância do mandamento judicial que impusera a suspensão todos os atos inerentes ao referido certame. 

Assim, ocorrera nítido descumprimento da decisão judicial pelo administrador público, culminando, indevidamente, na contratação de outra banca examinadora para realização do mesmo concurso de forma irregular, pois inexistira deliberação judicial posterior autorizando o andamento do feito ou revogando a tutela provisória anteriormente outorgada. 

É notório que gestor público vem reiteradamente descumprindo as decisões judiciais lhe impostas, sem preocupar-se com os danos que suas ações possam causar ao Município e à população em geral, que constantemente cria expectativas em atos ilegítimos e as vê subitamente frustradas. As decisões judiciais devem ser cumpridas: pois não são conselhos ou recomendações, porém comandos normativos e específicos dotados de imperatividade. 

No caso vertente, duas foram as decisões judicias proferidas (decisão no mandado de segurança nº 0700720-55.2015.8.01.0014 e 0700163-34.2016.8.01.0014), todas não cumpridas pelo requerido, sem qualquer justificativa. 

O deferimento da liminar em ação popular requer, ordinariamente, a presença dos pressupostos “probabilidade do direito” e “perigo de dano”. 

A probabilidade do direito consiste num exame em que o julgador contrasta os fatos que embasam a postulação da parte e as normas aplicáveis na resolução da questão, com o pedido realizado e verifica validade jurídica subsuntiva ou ponderativa do caso. Isto é, o Juiz observa se a pretensão tem consonância com o ordenamento jurídico. 

O perigo de dano, por sua vez, retrata situação de urgência na concessão do provimento pretendido, sob pena do patrimônio público vir a sofrer prejuízo de difícil ou impossível reparação, caso só venha a obtê-lo no fim do processo. Ou seja, é um requisito que busca minorar os efeitos danosos do transcurso do tempo em um processo. Da análise da documentação juntada e do mandado de segurança 0700163-34.2016.8.01.0014, sem prejuízo de se poder chegar à conclusão final diversa, entendo que, até o presente, são fortes os indícios de que o requerido deve proceder a suspensão do concurso público referente ao edital 005/16, para evitar um dano maior ao erário e também aos candidatos que comparecerão às provas. 

Diante do exposto, em virtude da patente ilegalidade da conduta do Prefeito Municipal, e com supedâneo no artigo 5º, § 4º da Lei 4.717/65, DEFIRO O PEDIDO LIMINAR para SUSPENDER o Concurso Público de Provas e Títulos referente ao Edital 005/16 da banca examinadora FUNDAPE, inclusive as provas que seriam realizadas no dia 18 de setembro de 2016, até posterior deliberação do juízo de mérito. Envie cópia destes e dos autos de número 0700163-34.2016.8.01.0014 e 0700720-55.2015.8.01.0014, mediante gravação em mídia digital de CD-R ou congênere, ao Ministério Público, para apurar eventual prática de improbidade e infrações penais, em razão da conduta dos agentes públicos envolvidos Prefeito Municipal de Tarauacá e todos aqueles envolvidos em atos decisórios no contrato administrativo formulado em descumprimento a decisões judiciais pretéritas. 

Cite-se o requerido pessoalmente para, em querendo, apresentar Contestação, no prazo de 20 (vinte) dias. Intime-se o Município de Tarauacá para suspender o certame e promover a mais ampla publicidade desta decisão, inclusive com a fixação de cópia integral desta decisão na sede da Prefeitura Municipal e das Secretarias Municipais, no prazo de até 1 (um) dia após a intimação do ente federativo, sob pena de multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais) ao Município de Tarauacá e, cumulativamente, multa pessoal no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) ao Prefeito Municipal. Intime-se a FUNDAPE para publicar, com urgência, no seu sítio eletrônico, a suspensão da realização das provas referentes ao certame alhures referido, em virtude desta decisão judicial, que ocorreria no dia 18 de setembro de 2016. 

Caso não o promova a publicação em até 1 (um) dia após a sua intimação, sujeitar-se-á à multa processual no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). 

Envie-se cópia desta decisão ao Delegado de Polícia Civil de Tarauacá, para que se promovam as investigações dos agentes envolvidos na realização ilícita deste concurso público, apurando a eventual prática do delito previsto no art. 319 do Código Penal ou demais infrações criminais que a autoridade policial encontrar indícios de autoria e materialidade. 

Intime-se o Ministério Público. 

Tarauaca-(AC), 14 de setembro de 2016. 

Guilherme Aparecido do Nascimento Fraga 
Juiz de Direito

1 Comentários

ATENÇÃO: Não aceitamos comentários anônimos

  1. E agora quem pagou suas inscrições vai sair no prejuízo e? Isso é uma palhaçada, aqui no Brasil e assim o fulano faz oq quer com a justiça mais quem paga o pato e a população, como sempre a corda só quebra para o lado mais fraco.

    ResponderExcluir
Postagem Anterior Próxima Postagem